AGENDA - Vencedor “Craveirinha” conhecido sexta-feira
É preciso explorar a escrita da mulher - Paulina Chiziane, dirigindo-se à comunidade académica da UEM
O feminismo negro de Paulina Chiziane (Concl.)
III
Paulina recusa o rótulo de romancista, definindo-se apenas como contadora de histórias, inspirada naquilo que ouviu, quando criança e adolescente, da boca dos mais velhos à volta da fogueira. É o que faz em seu romance Niketche, nome que define uma dança de iniciação sexual feminina da Zambézia e de Nampula, no Norte do país, região predominantemente macua, onde está a Ilha de Moçambique, primeira capital das possessões portuguesas da África Oriental e local de desterro do poeta Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), por onde passaram também em épocas diversas os poetas Luís de Camões (c.1524-1580) e Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805).
O romance conta a história de amor entre Rami, mulher do Sul e de nível social superior à da imensa maioria das mulheres do país, e Tony, alto funcionário da polícia em Maputo. Casada há vinte anos de papel passado e aliança no dedo e mãe de muitos filhos, Rami, desprezada pelo marido, desconfia de aventuras extraconjugais de Tony. Então, descobre que o marido tem mais quatro mulheres e muitos filhos. Vai à casa de cada uma das rivais, às vezes sai no braço com elas, mas, no final das contas, trava amizade com todas a ponto de, em certo dia, reuni-las em sua casa para fazer uma festa-surpresa ao marido.
A iniciativa, porém, desperta a ira da sogra de Rami, para quem a monogamia é um sistema desumano que marginaliza uma parte das mulheres, privilegiando outras, "que dá teto, amor e pertença a umas crianças, rejeitando outras, que pululam pelas ruas". Diz a sogra: "O meu Tony, ao lobolar cinco mulheres, subiu ao cimo do monte. Ele é a estrela que brilha no alto e como tal deve ser tratado. E tu, Rami, és a primeira. És o pilar desta família. Todas estas mulheres giram à tua volta e te devem obediência. Ordena-as". (CHIZIANE, 2002, p. 125).
Lobolo é o dote que o homem dá à mulher ao casar, mas lobolar aqui serve também para definir o ato de quem sustenta um lar. Ao conhecer suas rivais, Rami vai entrar em contacto com séculos de tradição e de costumes, a crueldade da vida e também com a diversidade de mundos e culturas que convivem em Moçambique.
É difícil entender estes pensamentos sem conhecer a dimensão da tragédia africana. Em país de poucos homens - milhares morreram na guerra, muitos ficaram mutilados, outros tantos emigraram -, as mulheres, aparentemente, aceitam dividir seus maridos umas com as outras, embora a poligamia venha de tempos já perdidos, quando os cultores do Islã desceram a África e disseminaram suas crenças e costumes.
Em alguns lugares de Moçambique, como na província sulista de Gaza, é comum que a mulher atenda ao chamado do marido de imediato, largando tudo o que está fazendo. Mais: quando o marido chama, ela não pode responder de pé. (CHIZIANE, 2002, p. 128). Também é difícil entender esta conversa sobre violência na família em que o imaturo Tony, fruto típico de uma sociedade patriarcal (CORREA, 2004), justifica a sua condição de polígamo: "Nunca maltratei a Lu, bati nelas algumas vezes, apenas para manifestar o meu carinho. Também te bati algumas vezes, mas tu estás aí, não me abandonaste para lugar nenhum. A minha mãe sempre foi espancada pelo meu pai, mas nunca abandonou o lar. As mulheres antigas são melhores que as de hoje, que se espantam com um simples açoite (...)". (CHIZIANE, 2002, pp.282-283).
Ou entender o conformismo de Rami: "(...) Transmito às mulheres a cultura da resignação e do silêncio, tal como aprendi da minha mãe. E a minha mãe aprendeu de sua mãe. Foi sempre assim desde tempos sem memória (...). (CHIZIANE, 2002, p. 254).
IV
Para as seguidoras de Simone de Beauvoir (1908-1986) e Flora Tristán (1803-1844), tudo isto, certamente, parece estranho, mas é a forma que Paulina encontrou de denunciar o sofrimento das mulheres africanas, subvertendo os valores tradicionais. Isso não significa que partilhe integralmente dos valores das feministas brancas. A dita civilização branca já levou tanto sofrimento à África que qualquer ideia, mesmo emoldurada por valores humanitários, sempre é recebida com desconfiança. E não poderia ser diferente.
O trágico é que o grito de Paulina, dificilmente, será ouvido ou compartilhado pelas mulheres de Moçambique, pois os escritores africanos escrevem para o leitor branco de fora de seus países que pode comprar seus livros, já que, em razão dos altos índices de analfabetismo e dos baixos níveis socioeconómicos, as tiragens nos países africanos de língua portuguesa são ínfimas, o que não significa que em Portugal e no Brasil sejam muito superiores.
Em Balada de amor ao vento (1990), seu primeiro romance, Paulina recupera as histórias dos rongas e dos chopes, que ouviu em sua infância, quando ficava a escutar a avó contar casos ao pé da fogueira. Os rongas, o povo do Sol Nascente, chegaram à região de Maputo há mais de 700 anos, procedentes dos Grandes Lagos. O povo chope veio da província de Gaza e da província de Inhambane, falando línguas bantu, da família Niger-Congo. Essas populações já estavam à beira da baía de Maputo quando os portugueses chegaram em 1502 à Terra dos Mpfumos (Grande Maputo), com o navegador Luís Fernandes à frente, numa caravela perdida de um comboio que seguia rumo à Índia (CRAVEIRINHA, 2002, p. 20).
As duas línguas que compõem este grupo são o XiChope, falado principalmente nos distritos de Inharrime e Zavala e no posto administrativo de Chidenguele, e o biTonga, falado na cidade de Inhambane e nos distritos de Maxixe e Jangamo. Estas são as origens de Paulina. Uma das histórias de sua gente é a de Sarnau, a jovem que descobriu que amava Mwando, um rapaz que estava encaminhado para ser padre. Como o namoro não prosperava, cada um vai para um lado e Sarnau acaba virando uma das mulheres do rei das terras de Mambone.
Paulina conta a história desse relacionamento, da juventude à idade madura, suas alegrias e sofrimentos, até a separação dolorosa e o reencontro. Mas, antes de tudo, trata do conflito vivido por uma moçambicana entre o mundo moderno e o mundo tradicional, a África arcaica, seus valores eminentemente machistas em que a mulher só existe para servir ao homem e constituir seu objecto de desejo.
Depois de casada e bem casada, Sarnau vê Mwando reaparecer e vive outro romance. Perseguidos, acabam de novo separando-se. Mwando, depois de se envolver com a mulher de um sipaio (soldado), foi deportado para Angola, onde passou quinze anos a plantar cana e café. Um filho de Sarnau, gerado por Mwando enquanto ela era rainha, acaba coroado rei, depois da morte do presumível pai, enquanto a mãe é obrigada a cumprir um destino de prostituição para sobreviver.
Este é um livro feminista, mas feminista à maneira africana: não é uma obra que desafie o estatuto da mulher africana ou moçambicana. Aliás, usar termos como africana e moçambicana é correr o risco das generalizações. No próprio Moçambique, há flagrantes diferenças: o Norte é uma região matriarcal, onde as mulheres têm mais liberdade, enquanto o Sul e o Centro são regiões patriarcais, extremamente machistas. E a narrativa de Balada de amor ao vento ocorre em Gaza, a mais machista de Moçambique, onde a mulher, além de cozinhar e lavar, para servir uma refeição ao marido tem de fazê-lo de joelhos.
V
Portanto, este livro traz o olhar do feminismo negro, que é diferente do feminismo branco, porque muito mais trágico. Ou alguém duvida que a mulher negra sempre foi muito mais oprimida e massacrada que a branca, que vive do suor de seu próprio rosto há muito mais tempo, que responde por sua própria família desde épocas imemoriais, embora fuja à luz da razão discutir gradações de violência?
Basta ler Barrocas famílias: vida familiar em Minas Gerais no século XVIII, de Luciano Figueiredo, para se perceber que o papel da mulher - e, mais ainda, da mulher negra - sempre foi esquecido nos livros de História do Brasil, como se a colonização e a ocupação do território tivessem resultado apenas da acção do homem (FIGUEIREDO, 1997, p.16). E que teriam sido raras as mulheres europeias que migraram para o Brasil e para a América hispânica, até porque nos séculos XVI, XVII e ainda XVIII havia muitas restrições à presença feminina a bordo de embarcações.
E, portanto, foram indígenas as mulheres que acolheram o afecto não só dos primeiros colonizadores como de tantos outros que continuaram a chegar ao Novo Mundo, bem como o fizeram as africanas e as miscigenadas, anos mais tarde, constituindo uniões consensuais e o concubinato, práticas contra as quais de pouco valia o pífio combate moralizante empreendido pela Igreja. Foi dessa população mestiça que nasceu, inclusive, a elite económica brasileira que nunca foi branca, embora sempre tenha procurado se passar por tal.
Por isso, as poucas mulheres idealizadas por nossa poesia arcádica oitocentista, como Maria Dorotéia Joaquina de Seixas, a Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga, e Bárbara Eliodora, de Alvarenga Peixoto (1744-1793), só foram incensadas pelo Romantismo do século XIX porque eram brancas, enquanto a negra Francisca Arcângela Cardoso, que deu quatro filhos ao mavioso Cláudio Manuel da Costa (1729-1789) e lhe inspirou vários poemas, está esquecida até hoje.
Tal como na África a mulher negra na América também buscou suas próprias estratégias de sobrevivência, desempenhou papéis económicos, criou os filhos e protagonizou muitas histórias - que, com certeza, estão à espera do talento de uma Paulina Chiziane brasileira para contá-las como se conta histórias à beira da fogueira e seguir uma tradição iniciada pela maranhense Maria Firmina dos Reis (1825-1917), a primeira romancista negra do Brasil
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Adelto Gonçalves (1951) é doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Bocage - o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003). E-mail: marilizadelto@uol.com.br
(*) Publicado no livro Passagens para o Índico: encontros brasileiros com a literatura moçambicana, de Rita Chaves e Tania Macêdo (organizadoras). Maputo: Marimbique Conteúdos e Publicações, 2012, pp. 33-41.
Referências bibliográficas
ARGUEDAS, José María. El zorro de arriba y el zorro de abajo. Buenos Aires: Losada, 1975;
CABAÇO, José Luís. Moçambique: identidades, colonialismo e libertação. São Paulo: UNESP São Paulo, 2009;
CHIZIANE, Paulina. Balada de amor ao vento. Lisboa: Caminho, 2003; Niketche. Uma história de poligamia. Lisboa: Caminho, 2002; O alegre canto da perdiz. Lisboa: Caminho, 2008; O sétimo juramento. Lisboa: Caminho, 2000; Vntos do apocalipse. Lisboa: Caminho, 1999;
CRAVEIRINHA, João. Jezebela: o charme indiscreto dos quarenta. Crónica de uma mulher. Lisboa: Universitária Editora, 2005; Moçambique: feitiços, cobras e lagartos. Lisboa: Texto Editora, 2002;
FIGUEIREDO, Luciano. Barrocas famílias: vida familiar em Minas Gerais no século XVIII. São Paulo: Editora Hucitec, 1997;
OESTERS, Christoph. Figuras do Outro: identidades pós-coloniais no romance moçambicano contemporâneo. Tese de doutorado. Universidade Utrecht, Holanda, 2005;
ORTIZ, Fernando. Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar. Barcelona: Editorial Ariel, 1973;
RAMA, Ángel. Transculturación narrativa en América Latina. Cidade do México: Siglo Veintiuno Editores, 1985.
Meios electrónicos;
ADICHIE, Chimamanda, 2009. The danger of a single story. Discurso na Universidade de Oxford, Inglaterra, em Julho de 2009.www.ted.com/talks/lang/por_br/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html. Acesso em: 17abr2010>;
CORREA, Eloisa Porto, 2004. “A trajectória descendente do amante viciado, tirano, sádico e manipulador em Niketche de Paulina Chiziane”. Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos.
- Adelto Gonçalves
Não se dá o devido valor à mulher escritora
PAULINA CHIZIANE: O doce sabor de se rever num caos
Entretanto, meio feliz e meio a leste destas reimpressões está a autora. Para ela, apesar de “ser agradável” ouvir e ver que um livro que escrevemos apresenta bons indicadores de mercado, o mais importante “é saber que o que escrevermos é lido”. A este propósito, Paulina Chiziane conta, com um misto de graça e júbilo, que, certa vez, a passar “pelo caos do Xiquelene (o bazar da Praça dos Combatentes) ” ouve um grupo de mulheres a gritar: “é ela…”
“Estavam em roda, às gargalhadas, e de repente gritaram e eu fiquei com medo e a pensar que me estavam a confundir ou que tivesse praticado algum pecado. Mas quando perguntei ‘fui eu que fiz o quê?’ uma delas respondeu ‘foi você que escreveu tudo isto’”. A gritaria do grupo de mulheres que visou a escritora vinha do deleite que iam tendo à medida que uma delas, em voz alta, lia as divertidas (ao mesmo tempo sintomáticas) histórias de “Niketche”, a história de poligamia que ela escreveu quando esteve baseada na Zambézia.
“Depois daquele medo no meio daquele caos senti-me bastante honrada, porque estava ali a ter a certeza que o meu ‘Niketche’ estava a ser consumido não por uma mas por várias pessoas, ao mesmo tempo, a partir de um só exemplar. Isso quer dizer que o que escrevemos pode ser conhecido não necessariamente porque os livros chegam às mãos dos leitores”, afirmou a escritora.
O QUE ESCREVI, ESCREVI…
Muitas vezes os livros reeditados sofrem algumas mexidas, muitas vezes para recontextualizar a história que se conta e outras para corrigir erros eventualmente cometidos anteriormente. Com Paulina Chiziane, no entanto, essa “regra” não existe. E a justificação é simples como esta: “se for a mexer numa coisa que escrevi, não estarei a ser fiel à essa escrita. Entendo que o livro escrito em determinado ponto é também o espelho do que o seu autor foi em determinada época. Por isso me renego a mexer nos meus livros antigos. O que escrevi, escrevi, não volto a mexer...”
A escritora conta que não mexer nos seus livros é também uma forma de os seus leitores acompanharem a sua trajectória não apenas nos temas mas também na escrita. “Eu também vejo minha trajectória, rio-me de mim mesma quando leio por exemplo ‘Balada de Amor ao Vento’, tal é a quantidade de erros que eu cometi. Por outro lado entendo que o meu livro é o meu espelho, por isso quero me ver sempre nele”.
Depois de o ano passado ter publicado dois livros, o romance “O Alegre canto da Perdiz” e o de contos “As Andorinhas”, a também autora de “Balada de Amor ao Vento” e “Ventos do Apocalipse” tem a vontade de recolher pensamentos e sentimentos a partir de objectos de culto. Não revela detalhes, reservando ao tempo a tarefa de desvendar o que vai agora na sua alma.
ARTES - "Na Mão de Deus" de Paulina Chiziane adaptada para o cinema
"Na mão de Deus", evoca a experiência da autora durante um internamento numa psiquiatria.
Através do relato da personagem Alice, a autora descreve o que lhe aconteceu durante a semana em que esteve internada numa ala psiquiátrica, em 2010, evocando todo o drama que diz ter vivido, desde as perturbações físicas e psíquicas, a “visões e vozes de entidades espirituais que se manifestavam de diferentes formas”.
O facto, segundo a própria escritora descreve numa entrevista que recentemente concedeu à agência Lusa, despertou-lhe para a mediunidade.
"Não existe margem nenhuma entre a Alice e a Paulina Chiziane porque fui eu que fiquei doente, tive um transtorno mental, baixei na psiquiatria uma semana", disse a escritora à Lusa.
A família, que a acompanhou no tratamento da doença, diz, nunca percebeu que se tratava do "despertar da mediunidade", fenómeno que é descrito à Lusa como "a capacidade de se estar num meio entre os planos físicos e extra físico", pela co-autora da obra, Maria do Carmo da Silva, uma médium e estudante de espiritismo.
"A minha família está ligada à cultura ocidental e como todas as famílias julga-se superior. Entretanto, elas não têm capacidade para gerir o invisível que é muito bem gerido pelas tradições africanas e asiáticas, algumas delas, e pelo espiritismo", defende Paulina Chiziane.
"O que pude constatar é que, com a minha doença, eu encontrei respostas muito positivas tanto na esfera tradicional, como tive assistência também do espiritismo", afirma.
Mas durante dois anos, a mulher escritora mais lida e traduzida de Moçambique optou pelo silêncio.
"A omissão tem a ver com o estigma social, que vem da religião cristã. Das tradições africanas nem tanto, porque sabem como lidar com este tipo de problemas. As tradições cristãs, a cultura ocidental onde tudo é palpável, tem que ser visível. Então, quando aparece uma doença causada pelo invisível, então a igreja vem dizer que não", afirma.
De resto, a autora de obras como "A balada de Amor ao Vento" ou "O Alegre Canto da Perdiz", acredita que, neste campo "não há mais esclarecidos".
"Acho que a cultura ocidental é menos esclarecida do que a africana neste campo. Quando um padre, por exemplo, diz que ele sabe, abençoa e que faz, o que é que ele está a fazer? Será que o que ele faz é superior ao que os nossos antepassados faziam?", questiona.
Paulina Chiziane acredita que "o caso da doença levanta todos os aspectos de cultura e tradição desde os tempos mais antigos: se foi o próprio Deus que criou a multiplicidade, porque a expressão divina não pode ser múltipla? Eu sou negra, sou africana, de uma terra lá de Manjacaze (sul de Moçambique). Eu para chegar a Deus não preciso da cultura de outro, porque Deus está em mim".
E, defende, "cada indivíduo deve ter a sua maneira individual, cultural de encontrar o supremo".
"Por que é que tenho que ficar presa a dogmas criados por tantas outras culturas? Temos que nos libertar. Eu rejeito a ideia de um Deus que vem da mão do ocidente. E a minha descrição toda caminha nesse sentido", afirma.
Minerva realize Feira do Livro
DIVERSOS - "O Último Voo do Flamingo": Mais um livro de Mia Couto no teatro
“Casa de Recordações” de Amilca Ismael
Depois do Cabo : Stewart apresentará “Nkuvu” na Europa
Alemanha e Portugal são os países onde reside a maior parte dos moçambicanos na Europa.
Particularmente para o festival do Cabo – um dos 10 mais importantes de jazz do mundo –, Stewart já se encontra em preparativos, já que terá lugar dentro de poucas semanas (o último fim de semana de Março). Os organizadores do evento viram no autor de “Nkuvu” um artista de grandeza suficiente para participar num evento de tamanha importância, em que cintilam artistas de jazz – e de ritmos nele enquadráveis, como os explorados por Stewart – de classe mundial.
A ida de Stewart ao festival da Cidade do Cabo acaba por ser um prémio merecido a um artista que tanto fez em 2008 em prol do crescimento e da projecção da música moçambicana. Através dos vários espectáculos que fez ao longo de 2009, Stewart Sukuma atraiu as atenções de muitos amantes da música, mas, também, de produtores e promotores de grandes eventos nacionais e internacionais.
Hoje, o artista vai rubricar com a empresa de telefonia móvel mcel um acordo de patrocínio. A empresa está a rever a sua política de patrocínios a eventos e actores culturais. Neste contexto, para além de Stewart, a empresa associou-se à produção do mais recente livro da escritora Paulina Chiziane, “As Andorinhas”, lançado na semana passada.
A associação da mcel a criadores culturais como Stewart e Paulina Chiziane é justificado pela companhia como produto de uma revisão da sua política de patrocínios, em que promete primar pela melhor qualidade e maior abrangência da sua actuação.
Paulina Chiziane e Mia Couto reeditados
Foi igualmente reeditado o livro É Proibido Pôr Algemas nas Palavras, das autorias de Paul Fauvet e Marcelo Mosse, que também retoma na sua segunda edição, pela Editorial Caminho, encontrando-se igualmente já disponíveis nas livrarias.
As obras esgotaram depois de terem sido reimpressas em meados do ano passado.
Com estes dois livros, os escritores foram laureados, em 2003, com o Grande Prémio de Literatura José Craveirinha, ano da sua primeira edição, este que é o maior galardão da literatura moçambicana.
E, no ano da passagem do 10º aniversário da morte do jornalista Carlos Cardoso, a obra É Proibido Pôr Algemas nas Palavras,da autoria dos jornalistas Marcelo Mosse e Paul Fauvet, também regressa ao convívio dos leitores, numa edição da Editorial Caminho.
Regressaram também ao convívio dos leitores as obras O Olho de Hertzog, do escritor João Paulo Borges Coelho. Com esta obra, João Paulo Borges Coelho ganhou o Prémio Leya.
UM DOS PRINCIPAIS ESCRITORES DA LITERATURA UNIVERSAL
“É, sem dúvida, um dos principais escritores da língua portuguesa, como Lobo Antunes”, comparou João Paulo Borges Coelho, detentor do Prémio Leya 2009, pelo seu mais recente livro, “O Olho de Hertzog”.
João Paulo Borges Coelho diz ter recebido “com tristeza” a informação da morte de José Saramago, autor do “Ensaio sobre a Cegueira”, um dos seus “livros predilectos”.
Para Paulina Chiziane, a morte de Saramago é “dolorosa”. Ela considera que o escritor português “partiu muito cedo”.
“Saramago ainda tinha muito que fazer, para nos dar. Meus Deus, ele foi muito cedo!”, reagiu Paulina Chiziane, reagindo “consternada” à morte do Prémio Nobel da Literatura.
“Lembro-me do trabalho de tradução do meu livro ‘Niketche: Uma História de Poligamia’ que teve ajuda do José Saramago. A tradução para o espanhol teve a mão muito firme dele”, disse.
“É dolorosa e difícil. Sinceramente, ele era muito jovem para morrer”, frisou a escritora mais conhecida em Moçambique, que conheceu José Saramago no bairro do Aeroporto em casa do pintor Malangatana.
MENÇÕES HONROSAS
Andes Chivangue recebeu a menção honrosa com o livro “Alma trancada nos dentes”.
Sangare Okapi concorreu com a obra poética “Mesmos barcos ou poemas de revisitação do corpo”, o livro foi lançado no ano passado.
Com esta obra ganhou uma menção honrosa do Prémio Rui de Noronha instituído pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Acção Cultural (FUNDAC), em 2004.
Já publicou o livro de poesia “Inventário de Angústias ou apoteose do nada”, com o qual ganhou o Prémio Revelação AEMO/Instituto Camões, em 2005.
Desde que foi instituído em 2004, venceram o Prémio José Craveirinha os escritores Mia Couto e Paulina Chiziane (dividiram o prémio na primeira edição), os poetas Armando Artur e Eduardo White em 2005, João Paulo Borges Coelho foi o primeiro escritor a ganhar inteiramente o prémio, em 2006, seguido do escritor Ungulani Ba Ka Khosa, no ano passado.
Mia Couto e Paulina Chiziane foram distinguidos pelos romances “Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra” e “Niketche”, respectivamente. Armando Artur e Eduardo White ganharam por “Os Dias em Riste” e “O Homem e a Flor”. Já o historiador João Paulo Borges Coelho foi reconhecido por “As Visitas do Dr. Valdez”. Ungulani Ba Ka Khosa foi laureado com este prémio pela obra “Os Sobreviventes da Noite”.
- Francisco Manjate
LITERATURA - “As Andorinhas" de Paulina Chiziane : Quando já não se inventa heróis...
Se queres conhecer a liberdade, segue o rasto das andorinhas - ditado chope citado por Paulina Chiziane em “As Andorinhas”
Em plena época de evocação dos nossos heróis – em especial aquele que teve o mérito de fazer confluir num só movimento aqueles que em plena década de África já se pronunciavam pela autodeterminação dos moçambicanos – a escritora Paulina Chiziane aparece com um brinde a que ninguém deve resistir, nem mesmo os novos reaccionários, aqueles que, amiúde, mais com verbo do que com atitudes, ameaçam a liberdade dos moçambicanos. A esse brinde ela intitulou “As Andorinhas”, uma pequena colecção de contos bem pequena, mas ao mesmo tempo grande.
Se o gordo imperador é uma figura consensual apenas do ponto de vista oficial, o mesmo não se pode dizer do fundador da FRELIMO, perecido há precisamente 40 anos, ou da atleta que será eternamente menina – e dourada – para os moçambicanos. “Ngungu” é, a julgarmos pela história e pela lenda (nesta se baseou Paulina Chiziane para questionar “Quem Manda Aqui?”), um líder que agradou muito a uns e nada a outros, particularmente aos chopes, que nutrem sobre ele uma aversão de estimação. É aquele conto sobre o homem que não é originário de Moçambique (descendente de um invasor, e por via disso e da sua postura também invasor, logo de heroicidade questionável, quanto a nós) que dá origem ao novo livro de Paulina Chiziane.
A escritora, uma chope nada em Manjacaze, terra do ponto de vista da divisão administrativa de Moçambique “pertencente” a estes e aos changanas, bebeu muito das histórias maioritariamente contadas pelo pai – alfaiate exímio contador de estórias, conforme ela faz questão de referenciar. A carga emocional com que escreveu “Quem Manda Aqui?” é reveladora do quão incontornável o coração em toda a racionalidade, o que equivale a dizer que o meio em que vivemos (por vezes) condiciona toda a nossa racionalidade.
MAIS OBRAS NO MERCADO LIVREIRO
ÍNDICO: UMA EDITORA PARA CRESCER
E a Índico não desiludiu, fazendo de “As Andorinhas” mais um trabalho bem sucedido, do ponto de vista de produção editorial, depois de o ano passado se ter estreado com “A Bíblia dos Pretos”, de Dom Midó das Dores.
A ambição dos jovens da Índico é fazer desta uma editora grande, a crescer ao ritmo do crescimento da nossaliteratura.
Paulina Chiziane optou pela Índico porque os jovens em frente à esta editora aproximaram-se dela e colocaram-na o desafio. “Eu é que os desafiei, dando-lhes oportunidades por serem jovens que mostraram ambição e seriedade. E estou satisfeita com o seu trabalho”.
Perguntámos à escritora se esta foi uma viragem em termos de editora, depois de vários anos editar por outras mais conhecidas. A resposta foi: “não podemos falar em viragens, porque nada é eterno no que fazemos enquanto formos vivos. O que aconteceu é que um grupo de jovens procurou-me propondo-me que publicasse por eles um livro. Como tivesse este, conversámos e decidi-me pela publicação”.
A Índico Editores é composta por jovens que ainda estão a iniciar-se no mercado livreiro moçambicano. Para a nossa fonte pesou a opção por eles justamente o facto de serem novatos. “Concordo com os políticos quando falam do apoio e incentivos à juventude. A minha opção pela Índico é justamente isso, um incentivo e uma oportunidade que dou aos jovens, porque sinto que eles precisam dessa oportunidade”.
- GIL FILIPE
LIÇÕES DE VIDA EM QUE ATENTAR
Uma obra literária escrita por um grande escritor – grupo em que cabem, na galáxia moçambicanas destes criadores, uns poucos, entre eles Paulina Chiziane – é fundamentada pelo contributo que ela dá à sociedade. E, desta vez, o que a escritora que se revelou com “Balada de Amor ao Vento” faz é um convite a uma reflexão que Moçambique tão urgente quanto necessária: porquê não há novas referências para a actual geração de compatriota.
Conforme constata Chiziane, os mais conhecidos heróis moçambicanos foram produzidos pela luta de libertação nacional, com a excepção de uma, Lurdes Mutola, a “Águia d’Ouro” que inspirou a escritora para o terceiro e último conto de “As Andorinhas”.
O ponto central dos três textos incluídos na obra “As Andorinhas” é a heroicidade. O percurso das três figuras em que se baseou a autora para produzir a obra é em si uma lição aos moçambicanos de hoje e do amanhã. Particularmente os de Eduardo Mondlane, o fundador da frente político-militar que pegou em armas para escorraçar os colonialistas do nosso território, e Lurdes Mutola, a atleta que, a partir dos finais da década de 1980, foi uma espécie de bálsamo às nossas frustrações, logrando vencer as suas mais temíveis adversárias nas pistas e assim projectar para altos voos o nome de Moçambique. Para Chiziane a educação Mondlane e Mutola foi crucial para que eles se tornassem em quem foram (e são) para os moçambicanos.
“Um pobre camponês, nascido numa aldeia do interior do nosso país e criado por uma avó, e uma jovenzinha nada num bairro como o Chamanculo, criada por pais de muito poucas posses, têm histórias de vida em que os pais de hoje deviam atentar para a educação dos filhos. Talvez a educação que tiveram em crianças terá sido crucial para que chegassem aonde chegaram, talvez tenhamos que nos inspirar nos que educaram estas figuras para instruirmos os nossos filhos”, comenta a escritora, que para escrever o conto sobre Mondlane leu a sua autobiografia “Chitlango, Filho do Chefe”, e o sobre Lurdes o que foi acompanhando desde os tempos em que a jovem atleta ainda era jogadora de futebol, na equipa masculina do clube Águia d’Ouro.
A escritora lançou “As Andorinhas” na semana passada, num evento bastante concorrido numa das unidades hoteleiras da cidade de Maputo. Para além dos elogios ao livro, feitos pelo produtor editorial da obra, Jaime Santos, e pelo apresentador Nataniel Ngomane, um momento foi assinalável: a empresa de telefonia móvel Mcel, patrocinadora do novo livro de Paulina Chiziane, ofereceu-lhe um computador portátil para, conforme disse o PCA Salvador Adriano, “nunca lhe faltar um meio para escrever as suas maravilhosas histórias”.
Este gesto veio de um facto curioso: a saída de “As Andorinhas” foi adiado umas vezes, porque o computador da escritora ia tendo sucessivas avarias.
Hasteámos a bandeira e parámos de discutir o projecto de nação – Alerta Paulina Chiziane, que convida moçambicanos para um debate afogado... pelo tempo
A partir daquele ponto procurou o “eu” de Moçambique, num contexto em que se fala de uma independência de que se não desfruta integralmente. E dessa procura o que sai é um debate tão actual quanto necessário, porque – defende – a sociedade moçambicana é mestiça. Esta representa a confluência entre o colonialismo e a africanidade, esta que às vezes sai ofuscada. E é essa mestiçagem, nas formas em que se manifesta no Moçambique de hoje, que dá corpo ao novo canto de Paulina Chiziane.
É um romance que fala abertamente do que é ser preto e ser branco; da “vantagem” e da “desvantagem” de ser mulato. Aliás, mulatos somos todos, porque culturalmente somos daqueles híbridos que nem sequer sabem que o são... Eis alguns trechos de uma conversa que tivemos com a escritora, depois de percorrermos as páginas de um livro que chama a nação para um debate nacional. Um debate nacionalista, porque está mais do que na hora de inicia-lo de peito aberto! !
- Vai no seu quinto livro, o romance “O Alegre Canto da Perdiz”. O título traz alguma curiosidade: o que é que a perdiz tem a ver com a história que traz desta vez?
- A perdiz é um animal, como muitos animais que poderia citar. Para eu usa-la aqui é porque há muita mitologia à volta dela. O nome da cidade do Gurué, onde eu trabalhei nos últimos anos, vem do canto da perdiz. Gurué, gurué... é assim que ela canta. Então, àquela cidade, há os que chamam Gurue e outros Gurué, imitando o canto daquela ave. E à volta disso há também os mitos da criação do mundo segundo os lomué e macuas. Portanto, dizem algumas vozes muito idosas que o mundo inteiro foi criado tendo como centro os montes Namuli. Quando falam do mundo inteiro referem-se ao dos macuas e lómuès. E os montes Namuli – dizem – foram criados no ovo de uma perdiz. Então, é daí que achei formidável criar o título a partir desta mitologia e destas estórias de uma terra também formidável. Toda a história também anda à volta dos montes Namuli, à volta da cidade do Gurué e à volta da Zambézia.
- O romance é fruto da sua experiência de vida naquele pedaço do nosso país ou é, digamos, uma espécie de visão de Moçambique como um todo no que se refere ao tema que agora explora: a mestiçagem e as suas manifestações?
- Gurué não é apenas centro de produção. Eu vivi e convivi anos lá. Emergi e bebi muito daquela cultura, que é bem diferente da minha. Aprendi muito dela, reconheço-a e respeito-a, como o devem ser todas as culturas, independentemente de se são nossas ou não, se nos são próximas ou distantes. Com tudo isso tive a vontade de fazer um registo de muitas das coisas de que se fala mas que na verdade não se conhece. Por exemplo, falamos muito do matriarcado, falamos do sistema matriacal e dizemos que o país é nesse aspecto dividido em duas partes a saber ...
- ... a norte e a sul do rio Zambeze com influência matrilinear e patrilinear, respectivamente...
- Isso mesmo!... Mas como é que se manifesta o matriarcado de que se fala no dia a dia? Tive a ocasião de viver neste mundo e então achei que devia partilhar um pouco desta experiência e vivência com outras pessoas que eventualmente passarão ter essa curiosidade.
- Exactamente que experiências é que quis partilhar sobre essas vivências e sobre aquela terra?
- Uma coisa que eu achei bonita é a filosofia do matriarcado. Quando falo da filosofia refiro-me à visão do mundo que eles têm. Como é que o mundo foi criado entre os macuas, fazendo comparação com a visão que se tem em sociedades patriarcais. Na visão patriarcal primeiro nasceu o homem e depois a mulher. Na matriacal primeiro foi a mulher e depois foi o homem. Vendo bem, este mito de origem é que determina comportamentos futuros, porque no matriarcado a mulher é o centro do mundo. É por isso que nos mitos de origem desse leito, nos contos à volta da fogueira, nós encontramos sempre a mulher brilhante, airosa, etc. Portanto, lá a imagem da mulher é muito mais forte que a imagem de um homem.
- Ao ler o livro deparamo-nos com uma história que não se refere só no Gurué, mas a uma esteira bem maior, que é Moçambique, e que algo lhe revolta na vivência do nosso país...
- Eu acho que são várias coisas e não apenas “um algo” a incomodar-me. Quando digo a nossa vivência e se me perguntarem exactamente o que é a nossa vivência como cidadã de um país eu não posso dizer, porque estou na lua, no ar... e não tenho um caminho nem uma norma. Nós como moçambicanos somos produtos daquilo que é a nossa tradição? De um sistema? De um contacto de culturas? Quem somos nós e aonde vamos? Como é que nos relacionamos uns com os outros? Então, estas são questões que não encontram respostas. Por vezes eu digo: houve ao longo do tempo, que a história conta, um período em que não tínhamos o colonialismo, depois veio o sistema colonial e houve muito debate, muita luta sobre várias coisas, incluindo a nossa identidade. Mas depois hasteia-se a bandeira da independência nacional e parece que tudo está bem. Nunca mais se voltou a discutir o projecto de nação. Como é que eu me relaciono com o meu antigo colonizador? Como é que eu me relaciono com o produto híbrido, que pode ser o próprio ex-colonizador que ficou por cá e pode ser até o próprio colonizado? Portanto, quem somos nós a partir de agora? A partir dessas questões fiquei com a vontade de usar a minha experiência da Zambézia para começar a falar da nação. Mas não é por acaso, porque a Zambézia, por aquilo que eu consegui constatar, foi uma região do país severamente afectada pelo colonialismo. Eu penso que a colonização naquela região foi muito mais violenta, pelos relatos que consegui ouvir, do que, se calhar, em algumas partes do país.
- Isso tem reflexo no comportamento e no perfil do zambeziano hoje, é isso que está a dizer?
- Sim, sim e sim! Eles são o que são por causa deste processo. Então, quando eu falo de indivíduo híbrido, estou a incluir aquele indivíduo que na sua aparência é autóctone mas que por dentro já não é; é uma mistura de tanta coisa, de violência, de colonialismo, de luta pela independência e de uma afirmação que nem sei se a independência lhes trouxe.
- Se tivesse que caracterizar o zambeziano, hoje, o que diria?
- É um povo muito sofrido, sei que outros povos que formam o povo moçambicano também sofreram, mas ali... É na sua terra onde o regime colonial português experimentou as suas grandes teorias de miscegenação, falando concretamente das teorias políticas de Gilberto Freire. É uma coisa que se sente, ou seja a pessoa entra naquela terra e sente que “aqui houve alguma coisa”. Eu colocava-me questões como “como foi possível, o que é que aconteceu, como é que se deu este processo?...” E foi com muita mágoa que eu percebi que a materialização destes grandes princípios políticos e filosóficos foi feito no corpo das mulheres. Portanto, é o sangue delas que, de certa maneira, esteve no prato da balança para a construção deste projecto de nação.
- E os homens? O seu corpo não deu alma nem construiu a nação?
- A situação do homem era outra! O homem é preto, o homem usa a força de trabalho, o homem é morto, o homem é deportado, etc., mas a mulher recebeu um tratamento diferente. Com isso pude também constatar um aspecto que é uma análise de género da história de Moçambique. Eu não sei se isso já alguma vez foi feito mas penso que é interessante analisarmos como é que o colonialismo influenciou as mulheres e os homens em Moçambique. Qual é o impacto de tudo isso na nossa vida, no nosso modo de ser e de estar? Para mim, o comportamento das mulheres, hoje, tem a ver exactamente com tudo o que a sociedade e particularmente elas foram viveram no passado. Tem muito a ver com todas essas políticas que eram ditas de desenvolvimento. As teorias são no papel muito bonitas, mas quando vamos ver na prática, as mulheres falam do seu sofrimento. Há marcas ainda hoje que testemunham isso. Trinta e poucos anos de independência são ainda muito poucos para apagar isso.
- Quais são essas marcas?
- Por exemplo, as nossas relações humanas: a relação da mulher negra diante de um homem branco! Eu às vezes digo, na aparência, pelo menos naquele tempo, a relação não era de amor! Nem sei dizer se as mulheres nessa altura, portanto as mulheres negras, atingiam o orgasmo. Era uma relação de dor e de submissão de alguém que diz “pronto, se eu faço o meu filho preto vai ser morto, então vale a pena fazer um mulato, pelo menos esse viverá”. É mais ou menos isso. Neste livro volto a perguntar: será que essas inquietações do passado já passaram? Quem é que já fez um balanço para saber como é que estamos e para onde estamos a caminhar?
- Na sua opinião a relação preta-branco é mera questão de sobrevivência e não necessariamente de amor? Referiu-se ao tempo colonial. E essa relação de interesse ainda ocorre hoje com a mesma frequência?
- Claro que sim! São sequelas do colonialismo. A situação do negro hoje ainda continua a ser o terror e o medo semeados e desenvolvidos pelo colonialismo. Porque foram muitos anos de violência colonial. A dominação portuguesa naquilo que é o nosso país começou há anos, antes mesmo de Moçambique ser formalmente colónia de Portugal. O mais importante, para mim, é de vez em quando discutirmos essas questões. O que eu coloco no livro é exactamente isso. Por exemplo: o homem negro, durante centenas de anos teve medo do branco, viveu aterrorizado por ele. E não deixará de ter esse medo nas três décadas em que formalmente conquistou a independência política. E isso é visível ainda hoje! A mulher negra, por sua vez, sempre teve medo do homem negro e do homem branco. Então, entre o homem negro e o homem branco ela teme mais o homem branco. Existem relatos soltos por aí assim do tipo num restaurante há vários negros à espera de serem atendidos e aparece depois um branco e ele é o primeiro a ser servido. Isso existe, porque se trata de uma sequela da violência do colonizador, que foi passando de geração em geração. Obviamente de outros factores também. Infelizmente o branco ainda representa em todos os sentidos o poder perante os negros. E a submissão dos negros tem a sua razão de ser. Penso que temos que discutir mais vezes estas coisas. Têm razão os historiadores quando recorrem ao passado para nos ajudarem a perceber algumas coisas e a interpretar aquilo que pode ser o nosso futuro. Em algum momento, durante a guerra de libertação nacional, que no fundo lutou e conseguiu uma libertação política, se discutiu a nação moçambicana. Definimos quem era o inimigo e defendemos que as diferentes raças têm que viver juntas. Alcançámos a independência e parámos de discutir essas coisas. Porquê? Esse debate tem que continuar, porque hastear a bandeira não é tudo. A minha intenção é provocar esse debate no seio da nossa família, a moçambicana, porque mais do que actual, esse debate é necessário.
- Acha que estamos numa situação de auto-desconhecimento, no que toca puramente à identidade, ou somos meros complexados nas relações entre uns e outros com base num mero detalhe que é a tonalidade de pele?
- Esse é um factor psicológico grande e que ainda está em peso nas mentes de muitos de nós. Pretos e brancos. E como factor psicológico isso vai levar muito tempo e muito mais tempo. E coloco as coisas de uma outra maneira: o colonialismo hoje ainda existe dentro de nós. E já não é estrangeiro. Nós somos os nossos próprios colonos. Nós é que nos rejeitamos a nós mesmos: eu como mulher negra rejeito-me, acho que a minha pele não é suficientemente clara e por causa isso tenho que comprar um clareador, que o meu cabelo não é suficientemente cabelo e tenho que ir buscar o verdadeiro modelo de cabelo. Portanto, por um lado temos o homem ou o ser branco a simbolizar o que o colonialismo foi dentro de nós. Mas por outro temos o próprio colonialismo que mudou e fez dos moçambicanos colonialistas de si mesmos. Não sei se estou a ser suficientemente competente, mas li muito Frantz Fanon, sobretudo “Pele Negra, Máscaras Brancas”, Eduardo Mondlane em “Lutar Por Moçambique” e em outros autores como estes encontramos o que aqui me refiro. E acho que não estou a fazer nada de novo. Os outros fizeram o seu pensamento político, as suas filosofias e eu pequei nos mesmos elementos e fiz o romance. De certa maneira, ao mesmo tempo que fazia as minhas leituras ia descobrindo que o colonialismo propriamente dito ainda não foi escrito.
- Não há nada escrito sobre o colonialismo? Os cientistas sociais, a começar pelos historiadores, avaliaram o colonialismo nas suas mais variadas facetas. Tanto aqueles de países colonizados como os dos colonizadores. E escreveram cientifica e sentimentalmente...
- Sim, é verdade. Mas o que eu digo é que nós falámos do colonialismo naquela parte que nos doía na altura. Queríamos a independência e pronto, falámos do colonialismo e o denunciamos. E a vivência, porquê não tratámos dela? Eu sou híbrida, filha de uma terra-macho, mas quando vieram com as armas, com a cruz e com a espada, de tanto a maltratarem, tornaram a minha terra fêmea, porque puseram o povo de joelhos. E quando o meu país recupera o sexo, com a luta de libertação e com a independência o que fica na verdade é o produto às vezes meio hermafrodita que somos. Hoje um dia somos machos e noutro sentido somos fêmeas como povo. Falo disso porque quando surgem as grandes teorias de Gilberto Freire, por exemplo, fizeram da nossa terra uma fêmea, onde as mulheres podiam ser violadas e usadas de qualquer maneira. E ai do homem negro que dissesse “estamos numa era do lusotropicalismo e então eu quero ter uma branca”, ele era morto imediatamente. Então, há que reflectir: o que é que nos deixou o colonialismo, quem somos nós, será que ele foi-se mesmo, com a independência de que tanto falamos desde 1975? Eu, por exemplo, quem me dirige e quem me ensina faz-me entender que para ser bom e para ser considerada primeiro tenho que passar pela escola da Europa. Então cria-se pretos com alma branca. Frantz Fanon já falava disso. Então eu acho que... não sei...
- Nesse aspecto não somos, então, uma terra liberta. Moçambique e África. África e América Latina. E alguma Ásia...
- Não, não, não somos! E não o seremos tão cedo. Acho que a liberdade é um processo. Temos uma bandeira, mas a hasteamos e a fazemos flutuar sobre quê? Não sei quantos anos ou décadas serão necessários, mas nós precisamos de ser libertos. Intelectualmente, economicamente... ainda não atingimos esse estado.
- Essa falta de liberdade não tem a ver com a falta de uma agenda nossa, inteiramente feita por nós mesmos, para nos debatermos? Falamos muito de nós mas com referência nos outros...
- Acho interessante isso! Durante a luta armada, por aquilo que eu consegui ler, sobretudo na poesia de combate, que penso devia ser lida por todos, jovens e adultos, apanho ali uma poesia-macho, de indivíduos que lutam por um ideal. Eh, pa! Ficámos com a dita independência e de repente parece que parámos no tempo e na luta. E acho que a culpa não é de quem trouxe a independência. Temos instituições, públicas ou não e a Associação dos Escritores é uma delas, que deviam criar espaços para esse debate. Os escritores têm que lançar esse debate. Os académicos, os políticos, os homens simples que tanto deram do seu pensamento, ainda que não reconhecido, para alcançarmos algumas das poucas coisas que alcançámos.
- Os moçambicanos estão aparentemente a resgatar o sentido de algo de nobre que há muito não se ouvia no nosso país, a auto-estima e o próprio Presidente tem insistido muito nisso nos seus discursos. De que é que estávamos à espera?
- Andámos a dormir! Os moçambicanos adormeceram talvez por motivos justificáveis. Como a própria euforia da independência, que tinha que ser digerida. Mas já chega, vivemos essa euforia e agora é preciso acordar e dizer “sou eu, aqui estou. Sou produto de uma luta justa, porque a minha terra tinha sido transformada em fêmea e era preciso lutar para recuperar a sua masculinidade”. É momento de começarmos a debater estas questões. A Associação dos Escritores, por exemplo, serve definitivamente para isso. As instituições académicas, religiosas, governamentais, etc. Isso é uma agenda que deve pertencer a todos. A nossa auto-estima como cidadãos é muito baixa! Eu conheço o moçambicano. Quando vai a uma conferência fora do país numa sala cheia de brancos enche o peito de ar ou empina o rabo e diz “eu sou assimilado” e não tem a coragem de dizer “eu sou negro e venho de Moçambique”. Já vi isso várias vezes. Algumas vezes até criticam-me dizendo “tu és muito tradicionalista...” Lembro-me agora que estive na feira internacional de Frankfurt com algumas pessoas que não eram de Moçambique mas dos países de expressão portuguesa, que foram muito preocupadas em falar o seu melhor português. Olhei para aquilo e fiquei assustada. E disse-me a mim mesma: “eu vou falar na língua da minha terra” e disse-lhes tranquilamente “esta língua que eu falo é aquela que os escravos falavam nas plantações de algodão”. E disse-lhes que falo essa língua e o português porque é outra língua que me deixaram. E fui a mais aplaudida!
- GIL FILIPE
LITERATURAS AFRICANAS DE LÍNGUA PORTUGUESA - Dez obras fundamentais na óptica de Sandro Brincher*
1. Terra Sonâmbula - Mia Couto (Moçambique)
O primeiro e um dos mais densos romances do moçambicano Mia Couto, hoje o mais popular dos escritores africanos de língua portuguesa, Terra Sonâmbula tem como pano de fundo o período de guerra civil pós-independência em Moçambique, mesclando realismo visceral a elementos fantásticos de forma absolutamente orgânica. Entre uma terra devastada, perambulando por uma estrada “mais deitada que os séculos, suportando sozinha toda a distância”, um velho e um menino buscam uma forma de sobreviver dentro daquela paisagem fantasmagórica. O romance foi adaptado para o cinema em 2007 sob a direcção de Teresa Prata, com co-produção portuguesa, alemã e moçambicana.
2. O vendedor de passados - José Eduardo Agualusa (Angola)
Há quem indicaria Estação das chuvas ou mesmo Nação crioula como livro-chave na produção de Agualusa. Entretanto, como nesta lista um dos objectivos ao indicar um livro é sempre despertar em quem o lerá a curiosidade de conhecer mais do autor indicado, penso que O vendedor de passados cumpre muito bem tal papel. É uma narrativa densa sem ser fatigante, com humor e amor na dose certa, satirizando com comedimento a construção da História e dos “heróis” daquele país, tudo visto através do olhar de uma osga (lagartixa), o narrador do romance. Resenha da contracapa: Félix Ventura escolheu um estranho ofício: vende passados falsos. Os seus clientes, prósperos empresários, políticos, generais, enfim, a emergente burguesia angolana, têm o seu futuro assegurado. Falta-lhes, porém, um bom passado. Félix fabrica-lhes uma genealogia de luxo, memórias felizes, consegue-lhes os retratos dos ancestrais ilustres. A vida corre-lhe bem. Uma noite entra-lhe em casa, em Luanda, um misteriosos estrangeiro à procura de uma identidade angolana. E então, numa vertigem, o passado irrompe pelo presente e o impossível começa a acontecer. Sátira feroz, mas divertida e bem-humorada, à actual sociedade angolana, O Vendedor de Passados é também (ou principalmente) uma reflexão sobre a construção da memória e os seus equívocos.
3. Yaka – Pepetela (Angola)
Yaka, apesar de não ser o livro mais representativo da produção ficcional de Pepetela (aliás, é destacar apenas um), é um dos mais importantes para entender questões fundamentais com as quais o autor vai trabalhar ao longo de toda a sua obra, sobretudo a relação colonizado/colonizador, tema que está na pauta do dia de discussões académicas há algumas décadas. Orelha da edição brasileira lançada pela Ática em 1984: Uma estátua, Yaka, pura ficção, surge como motivo condutor deste romance em que, nos finais do século passado, uma família de colonos se estabelece em Benguela, centro comercial que ombreava com Luanda. Recorrendo à memória familiar, Pepetela traça os vários momentos da saga desses colonos, misto de comerciantes e agricultores, mostrando como criaram a sua verdade referencial, tão diferente do contexto africano, que não tinham condições de entender. Alexandre Semedo, o velho colono, desde cedo convive, em segredo, com o mito da estátua; ao morrer, fica a saber, pela voz de Yaka, que a sua geração será a última. Yaka simboliza a migração de povos caçadores, mais tarde grandes guerreiros, que após chegarem à região de Luanda e irromperem, no século XVI, no reino do Congo, atingiram o Cunene, no extremo sul de Angola. O mito da unificação do território nacional, posteriormente tornado realidade, acompanha o Autor ao criar Yaka. A estátua está cuidadosamente guardada por Alexandre Semedo, desprezada pelos seus familiares, que com a independência fogem para o sul, e respeitada pelo jovem neto, que se torna um combatente do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), é mito ou realidade?
4. Os flagelados do vento leste - Manuel Lopes (Cabo Verde)Considerado um romance neo-realista, nele o fenómeno da seca cabo-verdiana é ao mesmo tempo paisagem e personagem. José da Cruz é um homem a quem as forças e as esperanças se esvaem, mas cujo ímpeto de sobrevivência o leva a procurar as forças de trabalho do antigo sistema colonial. A luta dura e inescrupulosa pela vida vai moldando personagens áridos como a própria ilha de Santo Antão, palco deste drama no qual a natureza, sempre implacável, é a força que dá alento e o tira com a mesma fluidez do vento que corta o arquipélago de Cabo Verde.
5. O testamento do Sr. Napomuceno - Germano Almeida (Cabo Verde)
Da contracapa da edição da Cia das Letras: Dez anos antes de morrer, o Sr. Napumoceno escreveu um testamento de “387 laudas de papel almaço pautado”. Ninguém imaginava que pudesse haver tanta novidade na vida do comerciante solteirão, de hábitos rigorosamente metódicos. Mas, nas centenas de folhas onde o Sr. Napumoceno registou a própria vida com toda a sinceridade, não se conta apenas a história do garoto de pés descalços que enriqueceu com trabalho, sorte e alguma malandragem: entrelaçado àquela existência surpreendente emerge o quadro vivo do quotidiano numa cidade de Cabo Verde antes da independência de Portugal, da década de 40 em diante.
6. Luuanda – Luandino Vieira (Angola)
Terceiro livro de contos deste angolano por adopção – Luandino nasceu em Portugal –, é constituído por três narrativas: “Vovó Xíxi e seu neto Zeca Santos”, “A estória do ladrão e do papagaio” e “A estória da galinha e do ovo”. Através do olhar do narrador, conhecemos o quotidiano dos musseques (favelas) de Luanda, a capital angolana. A falsidade da política de assimilação colonial, a falta de esperanças num futuro decente, a descoberta da solidariedade como forma de alívio da dor da existência, o olhar transformador da criança no meio dessa realidade dura: eis alguns dos temas que Luuanda nos oferece.
7. Balada de Amor ao Vento – Paulina Chiziane (Moçambique)As histórias que Paulina ouvia na infância são a fonte de onde Paulina extrai o material humano que descreve neste romance. Aqui conhecemos Sarnau, uma jovem que amava Mwando, rapaz a quem o sacerdócio estava designado como carreira. Entretanto, a relação não vinga, pois os seus destinos se separam. Sarnau torna-se uma das mulheres do rei de Mambone. Tempos depois, ela reencontra Mwando e o romance é actualizado; pela perseguição que sofrem, entretanto, separam-se de novo, tomando rumos igualmente terríveis: ele, deportado para Angola, cumprirá quinze anos plantando café e cana. Sarnau, que teve um filho de Mwando enquanto ainda era rainha, vê o menino ser coroado rei após a morte do falso pai, mas amargará uma vida de prostituição para sobreviver a partir daí.
8. A LOUCA DE SERRANO - DINA SALÚSTIO (CABO VERDE)
A produção de textos curtos é dominante na literatura cabo-verdiana. Segundo a professora e pesquisadora brasileira Simone Caputo Gomes, isto se deve, entre outras questões, à escassez de editoras e necessidade de se publicar em periódicos, de um lado, e a uma tensão, uma urgência na necessidade do que se quer comunicar, de outro. Sendo uma literatura de poucos romances, A louca de Serrano se destaca não somente por pertencer a tal género, mas também por ser o primeiro romance de autoria feminina na literatura de Cabo Verde. As marcas do feminino, porém, não se limitam à mão que escreve: estão evidentes nas faces, nos gestos, nas vidas que Salústio vai pintando sobre as paisagens hostis da ilha de Santo Antão. Enfim, um romance crucial para entender a condição sui generis de Cabo Verde no vasto panorama das literaturas escritas em língua portuguesa.
9. BOM DIA CAMARADAS – ONDJAKI (ANGOLA)
Da resenha de Helena Sut: “Bom Dia Camaradas", romance do escritor angolano Ondjaki, expõe a trajectória de Angola depois da independência, ambientado em Luanda na década de 80. Narra um momento que “aconteceu” ao autor e faz parte da formação da sociedade e da utopia. O protagonista é um menino da classe média pós-colonial que narra os seus dias em paralelo com o ano lectivo. Uma poética história que revela o mundo nos diálogos com o camarada António, nas aulas dos professores cubanos, nos cartões de racionamento, na visita da tia que vem de Portugal, nos medos, nas despedidas, nos sonhos e nas percepções em câmara lenta”.
10. OS FILHOS DA PÁTRIA - JOÃO MELO (ANGOLA)
Ao invés da epígrafe de Gabriel Pensador, “Essa é a Pátria que me pariu”, talvez a célebre frase dos Racionais MCs fosse igualmente apropriada: “Periferia é periferia em qualquer lugar”. Isto porque o retrato que João Melo – romancista, poeta, político, editor da revista electrónica África 21 – faz dos musseques não é em muitos aspectos diferente daquele conhecido da favela brasileira. Entretanto, a sua visão não é essencialmente fatalista. A efervescência de etnias, culturas e línguas imprime, sob a óptica do narrador, um carácter único a esses espaços. Os filhos da pátria percorre as formas através das quais a intersecção dessas características plurais dá corpo a uma identidade nacional, seja ela baseada num “tipo coerente de psicologia social humana” (citando Appiah) ou nas próprias diferenças que lhe são constitutivas.
- Sandro Brincher é mestrando em Teoria da Literatura na UFSC. Blog: africopoetica.wordpress.com
PAULINA CHIZIANE: Acordo ortográfico cria-me confusão
“O acordo ortográfico apenas me cria confusão. Eu defino a língua portuguesa como a minha viola e com ela quero tocar as músicas que quero. Se tenho que tocar com regras fixas ou se tenho que me adaptar, acho que isso é um problema menor. O acordo em si consiste, no fundo, em tirar o ‘c’ do facto ou o ‘p’ do óptimo. Se for só isso é pode ser um problema menor. Mas o que me preocupa são os efeitos colaterais dessa corrida por um acordo ortográfico”, comenta a escritora, questionando de seguida: “quantos dicionários Moçambique terá que comprar de novo? Quantos livros terá que mandar rescrever? Quantos livros de escola terão que ser refeitos, em nome de um acordo ortográfico? Será que valerá a pena sacrificar tanto dinheiro dos pobres só para tirar um ‘c’ e um ‘p’ do que está escrito?”
A escritora diz não recear problemas – se se confirmar a alteração ortográfica – em adaptar-se a novas regras. Contudo, convida a sociedade, a começar pelos centros de decisão do nosso país, para repararem nos efeitos colaterais de uma aceitação de um instrumento que mesmo em Portugal não colhe consenso. “Esteticamente não me afecta muito mudar de ortografia, porque será apenas uma questão de adaptação. Olhemos bem para o que temos como acervo literário do país. Teremos que trocar tudo! Tudo, incluindo os livros que os miúdos têm nas bibliotecas ou que os pais os guardam ou mesmo as Bíblias, que são lidas por vários milhões de nós, só por causa de um simples acordo ortográfico. Penso que é um capricho tão desnecessário quanto caro”.
A recomendação de Paulina Chiziane para os centros decisórios do país em relação ao acordo ortográfico é de que se pense “no que é bom para o nosso bolso, para os cofres do Estado, porque não há cooperação que vai suportar este capricho”.
EXTRAS - Paulina Chiziane em Nanhimbe
Doeria a qualquer um, como doeu, durante muito tempo e ainda agora, saber que os “Massukos”, do Niassa (não há doutro sítio), igualmente são mais valorizados fora das portas do que no seu país, apesar do valor que ninguém duvida. É o problema da verdadeira auto-estima, que na verdade está ausente. Que não é política, é cultural. E quando a auto-estima cultural se faz ausente... não há povo, se bem que este não vive de política, mas sim de si e ele não existe sem cultura.
E o que está a fazer a Paulina em Nanhimbe? Convidada, como dissemos pela referida associação, a falar com jovens, adultos e crianças, sobre a cultura, sobre a unidade nacional, sobre a verdadeira unidade nacional, mostrando aos seus admiradores o quão nacionais são os temas que aborda nos seus livros, a maneira como tocam a cada moçambicano de todas as localidades sem olhar ao Norte, Sul, Oeste, Centro e todos os outros pontos cardeais e intermédios que o país tem.
Paulina está hospedada num bairro, no que vai ser a cidadela cultural do Tambo Tambulani Tambo. Ninguém acredita que seja ela, a “Nikecthe”, a “Sétimo Juramento” e tudo aquilo que ela fez e continua a fazer. Esperava-se uma mulher com unhas pintadas, de sapato salto, enforcada de ouro no pescoço e com os dedos todos douradamente anelados, que não se sentasse à volta da fogueira para conversar com as gentes, que não comesse qualquer coisa que lhe trouxessem e que não bebesse nada para além da água “Vumba” e não fumasse outra marca, para além do “Palmar” azul.
Mas Paulina está aí, até ao dia 20, a viver a vida real, conforme o bairro de Nanhimbe lhe proporciona. Vai tacteando algo na língua que ali se fala, vai percebendo mais um pouco sobre este país e vai levando as crianças e adolescentes, pelo seu exemplo, a entenderem a nossa própria importância e evitando que cresçamos de forma postiça.
Com Paulina estão outras pessoas sérias, vindas de outros cantos do mundo, que igualmente convidadas pelo Tambo vieram ver o mais importante de um povo, a cultura. Pessoas simples como a Paulina, vindas dos Estados Unidos, do Brasil, da Holanda e de outros pontos onde o desenvolvimento é um senhor, razão porque a valorização da cultura não é um discurso, é o dia-a-dia. E estão hospedadas nas casas que o Tambo Tambulani Tambo fez para receber os hóspedes, em camas de “Cambala”, que noutras paragens chamam-se quitandas, a viverem das severas e rigorosas restrições de energia eléctrica que nos últimos dias Pemba está a sofrer e sempre a dizerem: “Não tem problema! Pouco não! Problema não!”
Ora, entre todas as pessoas ali, a participar no festival que Tambo promove, Paulina é a coisa mais extraordinária, mais admirada e assediada, muitas vezes por quem nem sequer leu nada por ela escrito. A Paulina não está em Pemba, não está no Wimbe, ninguém a vê, aqui e ali, ela está em Nanhimbe e corre o risco de não ser deixada sair de Nanhimbe, não sei como se arranjará depois.
Paulina, ao lado da Ângela, a brasileira, a Cristina, americana e de outros estrangeiros, confunde-se e parece ter vindo de um país ocidental-africano para ver quem somos. Diz que se sente bem e não sabe se da sua estada em Nanhimbe não sai mais um...
- Pedro Nacuo
Paulina Chiziane vai ao cinema
Língua portuguesa na perspectiva de globalização
SR. DIRECTOR!
É verdade que este “português” que nos une do (rio) Rovuma ao Maputo (capital), do (distrito) do Zumbo ao Índico (oceano) é uma herança colonial que dificilmente nos será arrancada por quem quer que seja.
Exemplo. Mas mesmo assim as reclamações não cessam, ora porque a qualidade de ensino (do primário ao superior) não é o desejável, ora porque algo foi vergonhosamente mal escrito (pronunciado).
ntretanto, quando se faz a apreciação dos detalhes no geral sobre o assunto, a língua “bantu”guês (português misturado com línguas nacionais), com as suas generalidades (de norte a sul) e especificidades (grau académico), se faz presente. Fazendo surgir um contencioso. Entre antigos “assimilados” (época do ultramar) e os novos usuários (pós-independência). Porquê?
O imbróglio cessa geralmente com intervenção (mediação) de um antigo estudante, no Brasil ou em Portugal. Disso é exemplo o que acontece na literatura, na classe jornalística, na advocacia, e de uma forma geral (abrangente) na educação. Mas porquê? Portugal, hoje, faz uma campanha sem precedente, utilizando os meios de comunicação (RTP) de que dispõem para difundir as novas regras de escrita. O Brasil faz o mesmo, utilizando a Internet (Mozilla Firefox). E nós? Como fazemos? Corrigimos obedecendo a que padrão? O português do ultramar (Salazar e Caetano) ou o pretendido pelo professor Cavaco Silva?
Contudo, para a nossa salvação (auto-estima), um encontro à escala nacional com personalidades ligadas as artes como: Paulina Chiziane, Ungulani Ba Ka Khosa, Filomone Meigos e outros da AEMO, Manuela Soeiro, Gilberto Mendes, Adelino Branquinho e outros do teatro, Stewart (Stuart), Salimo Mohamed, Mingas e outros músicos, a classe jornalística (de ontem e de hoje), académicos (estudantes), personalidades da sociedade civil, revela-se oportuno, de forma a desactivar o mau hábito de corrigir de forma duvidosa e ultrapassada as nossas expressões linguísticas (“xicalamidade” = calamidades ou “maparato” = pratos, etc.) e, acima de tudo, a nossa ortografia.
A partir desse momento, acreditem, não haverá espaço para se falar de má qualidade de ensino no país; de projectos de desenvolvimento mal elaborados (escritos) e prejudiciais ao meio ambiente; ou de interpretações ambíguas e desniveladas. Mas, como disse, é necessária uma concertação social, envolvendo estes actores, directamente globalizados, e de carácter urgente. Caso contrário, o nosso currículo académico, nossa literatura, etc., continuarão dependente da correcção de cidadãos do Brasil (maior interessado no acordo ortográfico) e de Portugal (país de origem). Ou aceitar o acordo ortográfico e divulgá-lo imediatamente como acontece em Cabo Verde e São Tomé e Príncipe (fluentes em crioulo), neste momento. Porque, a este ritmo, quando Brasil e Portugal implementarem na totalidade o acordo, mais nada pode ser feito para reter o avanço. Resta-nos adaptarmo-nos [atrelar] à nova realidade. Ou deixarmos como herança mais este problema (de escrita), entre nós (geração da viragem). Que pelo sim ou pelo não, deixa-nos numa posição imprópria.
- César Tagir
MANKEW VOLTA A SER “INTERNACIONAL”
Enquanto isso, Mankeu Mahumana expôs as suas pinturas numa galeria em Berlim, que resultou na venda de parte da sua arte, o mestre Graça “deliciou” os moçambicanos e não só com o seu cozinhado tipicamente moçambicano.
O decano da pintura moçambicana teve na Alemanha mais uma oportunidade de internacionalizar o seu trabalho, já que há vários anos que não expunha no estrangeiro. Mesmo por cá, apesar de ser um veterano da arte e estar sempre a trabalhar, conforme assegurou numa entrevista ao “Notícias”, raramente expõe, o que, segundo ele, se deve à falta de oportunidades.
As esculturas dos artesãos ligados ao grupo de comércio livre, levada a Berlim por Utília Aquino, do FUNDAC, não foram expostas, uma vez que o material esteve retido pelas autoridades alfandegárias alemãs pelo menos até a última segunda-feira.
Durante o encerramento, o vice-ministro da Educação e Cultura, Luís Covane, disse que é através da cultura que os moçambicanos melhor apresentam a sua identidade, bem como os seus hábitos e costumes.
Covane acredita que a realização da semana cultural de Moçambique na Alemanha foi a melhor forma de apresentar o país e as suas potencialidades neste país, um dos maiores centros culturais da Europa.
“A apresentação de Moçambique através da cultura constitui uma forma de valorizar as nossas tradições e acreditamos que é a forma de chegar a qualquer parte. Notámos um engajamento dos artistas que com o seu espírito patriótico deram o seu melhor para representar de forma condigna o país”, referiu.
Para Covane, a semana de Moçambique na Alemanha termina, porém permanece a determinação de continuar a manter e alargar as relações de cooperação bilateral, com destaque para a cultura.
Independência de Moçambique: Alemanha testemunha fim da semana cultural
De sublinhar que o artista plástico Mankew Mahumana, o mestre da culinária Carlos Graça e a representante do grupo de artesãos ligados ao grupo de comércio justo vão permanecer em Berlim até o próximo dia 1 de Julho, realizar várias actividades.
A cerimónia de encerramento será orientada pelo vice-ministro da Educação e Cultura, Luís Covane, que já se encontra em Munique, e não pelo ministro do sector, Aires Ali, conforme estava previsto.
Luís Covane chegou a Alemanha no último domingo, tendo escalado a cidade de Estugarda, para visitar algumas infra-estruturas escolares, no âmbito da parceria existente entre os Governos dos dois países no sector da Educação.
A delegação moçambicana é composta por músicos, bailarinos, escritores, pintores, escultores e cozinheiro, bem como representantes dos ministérios dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Transportes e Comunicações e Energia e Centro de Promoção de Investimentos (CPI).
Antes do encerramento, os artistas moçambicanos estarão envolvidos em algumas actividades culturais, enquanto que os representantes dos ministérios vão participar numa conferência económica com empresários alemães, onde vão apresentar as oportunidades de investimento em Moçambique.
Durante a semana, os artistas participaram em “workshops”, exposições e fizeram diversas actuações nas cidades de Berlim, Hamburgo e Estugarda, devendo fazer o seu último espectáculo hoje em Munique.
Os representantes dos ministérios participaram em conferências de negócios nas cidades de Berlim e Hamburgo, estando agendada a última para hoje, igualmente em Munique.
Ainda durante a semana, a delegação participou na celebração dos 34 anos da Independência Nacional, assinalada no passado dia 25 de Junho, uma festa que contou com a presença de mais de 600 convidados, da qual maior parte eram moçambicanos residentes na Alemanha.
A Semana de Moçambique na Alemanha insere-se na divulgação das potencialidades culturais, turísticas e artísticas do país, como também pretende reavivar a chama patriótica dos moçambicanos lá residentes, a amizade e cooperação com aquele país.
Entretanto, a Companhia Nacional de Canto e Dança (CNCD) actuou na última sexta-feira no “Haus Fur Kulture der Welt” (A Casa para a Cultura do Mundo), um dos maiores e mais modernos teatros da Europa, localizado em Berlim, na Alemanha.
Nesse espectáculo, a CNCD, que actuou durante cerca de duas horas, apresentou as suas obras mais emblemáticas, nomeadamente, o “NTSAY”, um bailado criado por David Abílio, que conta a história de Moçambique, e “Em Moçambique o Sol Nasceu”, da autoria do mesmo coreógrafo, que é uma amostra das danças mais representativas do nosso país.
A actuação dos “Embaixadores da Cultura Moçambicana” foi testemunhada por mais de três centenas de espectadores, entre moçambicanos residentes na Alemanha e os próprios alemães. A CNCD actuou também na cidade alemã de Hamburgo, no contexto da semana de Moçambique.
A delegação da Companhia é composta por 34 membros, entre bailarinos e cantores. Para além de Berlim e Hamburgo, esta companhia agendou concertos para a cidade de Munique.
A Companhia Nacional exibiu ainda música tradicional, com enfoque para a Timbila, um instrumento musical já proclamado pela UNESCO como obra-prima do Património Mundial da Humanidade.
Enquanto isso, os músicos moçambicanos Mingas, Wazimbo, Stewart e Neyma tiveram também várias actuações no mesmo âmbito.
Os escritores Paulina Chiziane e Nelson Saúte participaram em sessões de literatura em alguns pontos da Alemanha, enquanto a Companhia de Teatro Mutumbela Gogo apresentou na cidade de Estugarda algumas das suas obras mais emblemáticas.
O pintor Mankew Mahumana realizou várias exposições artísticas, bem como manteve contactos com outros artistas, estudiosos e alguns dos seus admiradores na Alemanha.
- Fátima Mimbire, da AIM, em Berlim
Custo do livro afasta leitores das livrarias
Em vésperas do Dia Internacional do Livro e dos Direitos de Autor, que se assinala amanhã em todo o mundo, a velha questão sobre o livro e o gosto pela leitura volta a ser levantada em diversos fóruns. Para muitos jovens por nós inquiridos, mais do que se perguntar se eles lêem ou não – o que estão a ler -, a questão do momento seria “o que se faz para que haja mais livros nas mãos dos leitores”…
“Eu leio o que posso e releio o que já li antes porque não tenho dinheiro para comprar obras novas. Gostaria de ler por exemplo ‘O Alegre Canto da Perdiz’, de Paulina Chiziane. Acontece que o livro, que chegou a ser vendido a 500 meticais nas livrarias, esgotou sem que eu conseguisse dinheiro para o comprar. Estava demasiado caro para mim. Ademais, na rua, aonde muitas vezes recorro quando preciso de livros, nunca o encontrei”. Este comentário, de Januário Melice, estudante da 12ª classe, elucida o quão difícil é os jovens terem acesso – e, por vezes, gosto – pela leitura no nosso país.
O recurso a alfarrabistas surge do óbvio facto de a maioria dos moçambicanos que gostam de ler não terem acesso a livros no mercado formal, conforme deu a entender Lauro Chacate, outro jovem estudante e também a frequentar a 12ª classe numa das escolas da capital do país. “Na rua comprámos vários livros. Para mim não interessa se o livro é novo ou velho. Tem que estar em bom estado. Se for o que os professores recomendam, o importante é que tenha páginas completas. Semana passada, por exemplo, ‘acertei’ uma obra de Jorge Amado que há muito precisava. Está velha, a cheirar a mofo, mas está completa. Para mim isso é o mais importante principalmente se tomarmos em conta que na livraria esta obra (‘Capitães de Areia’) custa 630 meticais e eu comprei por 120, depois de ter negociado o preço, que inicialmente esteve marcado por 200”.
Quem se sente bem com o negócio de livros em segunda mão são os alfarrabistas. Antoninho, que de dia ocupa uma esquina da baixa da capital do país para vender obras de vários autores e campos de leitura e de noite se senta na carteira de uma das turmas da 11ª classe da Escola Secundária Francisco Manyanga, diz-se feliz com o seu trabalho: “sinto que somos úteis à sociedade, sobretudo àqueles que, como a maioria de nós, não tem dinheiro para enfrentar os preços praticados pelas livrarias. Se quer saber, eu nem sequer vou a uma livraria…”
Questionado sobre onde adquire os livros que vende, a resposta de Antoninho não tardou: “sei que muita gente pensa que nós roubamos livros nas livrarias e bibliotecas. Fosse isso verdade já tínhamos sido apanhados há muito tempo. Nós compramos os livros a muita gente, nomeadamente pessoas que os têm em casa e se querem livrar deles. Diariamente, muita gente procura-nos para nos vender livros usados. Naturalmente que só compramos aqueles que sabemos que podem ser comprados e a preços que nos são vantajosos”.
Para este jovem, para se ser um bom alfarrabista é necessário conhecer minimamente os livros, sob pena de comprar “um monte de coisas que ninguém mais quererá ler”.
Amanhã, o mundo comemorará o Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor. No nosso país, várias actividades associadas à data já decorrem, com enfoque para debates sobre o acesso ao livro em Moçambique, feiras, feiras de literatura, tertúlias, cursos de literatura e outras actividades que marcarão a semana do livro, a sua importância na formação do homem na sociedade.
Belizário de Castro, estudante de Estatística e Gestão de Informação na Universidade Pedagógica (UP), considera que o livro é uma fonte de aquisição de conhecimento consoante as necessidades de cada um.
De Castro afirma que, “infelizmente hoje as pessoas procuram mais os livros não para terem conhecimento ou estarem a par do que acontece no mundo, mas porque querem fazer trabalho da escola e procuram uma matéria específica naquele momento e depois tudo é esquecido.
Por outro lado, Simão Pedro António Nhambessa, técnico documentalista e funcionário no BCI-Fomento, afirmou que, diariamente, a biblioteca da sua instituição recebe entre 190 a 200 estudantes diariamente, sobretudo universitários e que cursam áreas como Gestão, Direito, Economia ou Informática, procurando obras específicas de referência para elaborar trabalhos recomendados pelos docentes nas suas instituições.
Nhambissa afirmou que é um caso rara receber pessoas que apenas queiram somente informar-se, o que tudo indica que as pessoas só procuram livros em casos de recomendações numa fase em que o homem precisa cada vez mais de estar perto do manual e de informação sobre vários factos que acontecem no dia-a-dia no nosso país e no mundo inteiro, podendo dar o seu contributo, opinião e comparar os acontecimentos narrados nas obras e as experiência vividas no dia-a-dia.
O livro é uma fonte inesgotável de conhecimento e da oportunidade de as pessoas poder aprofundar os conhecimentos tidos na escola e discutir conceitos literários através da investigação, disse a fonte.
Por conseguinte o nosso interlocutor disse que “o dia do livro deve servir de reflexão para todos os moçambicanos no sentido de cada um buscar aquilo que é o conceito do livro bem como a sua importância para a formação e informação do homem”, pois, cada um de nós deve através do livro descobrir os seus erros e assim corrigi-los para que haja uma comunicação saudável e aprimoramento da linguagem, acrescentou.
ESCOLA DE JORNALISMO ABRE ANO LITERÁRIO
ESGOTOU-SE A PERDIZ
Este ano confirmou esta sua força ao publicar “O Alegre Canto da Perdiz”, que lançou em Junho sob chancela da Ndjira. Esta obra, em que faz cantar várias perdizes a partir de um canto especial de Moçambique, a cidade do Gurué, na Zambézia, para onde foi trabalhar há alguns anos, chama os moçambicanos a reflectir sobre temas como a mestiçagem e a independência, de que, segundo ela, os moçambicanos não estão a desfrutar integralmente.
Este livro volta a ser notícia, mas desta vez porque se esgotou. É das poucas vezes que uma obra “some” do mercado livreiro nacional em pouco tempo. Segundo fonte da Ndjira será feita em breve uma reimpressão.
O aliciante deste romance está na forma aberta e franca com que a autora coloca a sua forma de ver as coisas: o que é ser preto e ser branco; da “vantagem” e da “desvantagem” de ser mulato.
Aliás, segundo ela, mulatos somos todos, “porque culturalmente somos daqueles híbridos que nem sequer sabem que o são...”
PORQUE É QUE TENHO QUE SER LUSÓFONA?
Polémica dos números à parte, Paulina Chiziane é uma cidadã céptica quanto ao andamento e utilidade da CPLP. “Quando ouvi falar da CPLP antes pensei que era uma coisa bonita, mas hoje cada vez que me falam, falam-me também da lusofonia e por isso chamam-nos cidadãos lusófonos. Eu já sou africana, sou moçambicana, ainda vou ser lusófona? O que é isso? O que é que é que estas organizações querem? Não sei”.
A escritora afirma recear que esta organização e outras similares venha trabalhar na recolonização de uma mente que já está colonizada. “Quando se está na lusofonia, é preciso falar lusofonicamente. Se eu e o meu povo não sabemos falar o luso, como é que vamos falar lusofonicamente? Então, não gosto muito e tenho medo destas instituições”, sublinha.
Arte, estética e ética: a possibilidade de existir* (Concl.)
Como pudemos verificar nos exemplos acima colocados, em todas as realizações artísticas, desde que assumidas como tal, mesmo tendo em conta a existência de um naipe diversificado de motivações e de funções, a função estética surge sempre como dominante. Numa obra intitulada, Escritos sobre Estética e Semiótica de Arte (1981), o checo Jan Mukarowski faz uma análise aprofundada sobre a natureza e a abrangência da função estética que determina, por exemplo, a transposição do artesanato, da fotografia, da liturgia (católica e ortodoxa, especialmente) para o âmbito artístico.
Serão pois os processos perceptivos, em última instância, que tanto o belo artístico como o belo natural desencadeiam no espírito humano, manifestando-se através do efeito e da emoção estética, que irão concorrer para que os seres humanos se realizem numa espécie de auto-superação que os eleva e os singulariza. Mais do que um substituto da vida, a arte é uma amplificação da existência tornando possível aquilo que, de nenhuma outra forma, seria possível. Ela alarga e aprofunda a nossa sensibilidade, as nossas percepções, iluminando os labirintos da nossa vida interior, tornando suportável o insuportável, dando sentido ao que não tem sentido, enchendo de cores, sons e vibrações a imobilidade acinzentada e trivial que nos envolve ou a que reside dentro de nós.
A obra de arte, além de constituir factor de libertação e de emancipação em relação ao supérfluo, no mundo desencantado que construímos, é ela que, em última instância, assegura cintilações de encantamento desse mesmo mundo.
Lembremo-nos, entretanto, que a evolução da reflexão estética que se dá no século XVIII, com Baumgarten e com Kant, coincide com a revolução romântica que substitui a ideia clássica de mimesis, pela ideia de criação. Isto é, arte deixa de ser imitação e passa a ser concebida essencialmente como um exercício criativo. A partir daí, quer a importância que o sujeito adquire no processo criativo e perceptivo, quer a relevância que os elementos compositivos, estruturais e temáticos ganham no processo de criação artística concorrem para uma maior liberdade contemplativa, interpretativa e fruitiva.
Por outro lado, vamo-nos confrontando, a partir desse momento, com uma aitude inovadora e revolucionária que vai concorrer para que, a posteriori, nos momentos de ruptura ou de grande contestação artística seja possível acrescentar, de forma quase ilimitada, novos critérios de esteticidade onde passa também a caber o feio, o mau gosto, o insólito, o subversivo. Todos estes elementos impõem-se mais como meios do que propriamente como fins. Digamos que se tratou de uma transformação que assegurou a passagem de uma perspectiva abstractizante e generalizante para um âmbito de realidades estéticas e artísticas concretas que fazem parte do nosso mundo.
E aí, diferentemente do que antes acontecia com a estética clássica, a norma, que é uma espécie de regra geral que tende a ser obrigatória e que deve ser respeitada por todos, acaba por ser sistematicamente violada, pelos criadores, em especial, permitindo o surgimento de novos cânones, novos valores e novos gostos. Tal como o homem, tal como as sociedades, a arte vai-se renovando continuamente, asssumindo essa renovação como condição essencial da sua existência e denunciando a contingência das normas e dos valores estéticos. Isto é, não só não podemos falar de normas e valores estéticos universais, como também estes não devem ser tidos como imutáveis. Mesmo as grandes obras de arte tidas como eternas e universais conhecem processos perceptivos e avaliativos adptativos para assegurarem a sua duração.
É, pois, através desses processos adaptativos, em contextos temporais e espaciais variados, numa permanente educação do gosto, levados a cabo pela cultura, pela família, pela escola, pelas exposições, pela publicidade, pelos museus, pelas bibliotecas, pelos meios de comunicação de massas, pelas feiras, pelos prémios, pela crítica, enfim, por diversas instituições, órgãos e práticas, que fica garantida a recepção, a perpetuação e a reinvenção do valor da arte, da cultura e, em última instância, da espécie humana enquanto dimensão espiritual.
Numa era de aceleradas e profundas transformações, como as que se verificam hoje, no mundo, e em Moçambique, em particular, qual o lugar e o papel da arte?
Gostaria de começar este capítulo mencionando três exemplos que podem ilustrar, cada um à sua maneira, o papel que a arte, enquadrada no vasto contexto da cultura, pode desempenhar numa sociedade como a nossa.
O primeiro tem a ver com o Mestre Ernesto Missau, velho artesão makonde, radicado em Mocuba, província da Zambézia, que numa entrevista ao suplemento Cultura do jornal Notícias, há cerca de um ano, explicava porque tinha deixado de fazer esculturas, actividade que, pelo que pude perceber, se dedicara praticamente toda a sua vida.
E a explicação vinha em forma de um desabafo extremamente penoso, em que o velho artesão, uma das maiores legendas vivas dessa arte, dizia, no essencial, que tinha abandonado a escultura porque assistia impotente à degradação dos princípios e dos valores que sempre a sustentaram, porque não suportava o desinteresse e o desrespeito a que estava votada a arte Makonde, quer pelo Estado, quer pela sociedade. Com uma enxada, ao ombro, dizia, que era na agricultura que ele dedicava, agora, todo o seu labor e saber. Sem ter necessidade de ter que se ajoelhar perante ninguém, ou ter que se deixar ficar, de mão estendida. Ou ter que abrir mão da sua dignidade.
O segundo exemplo que vos trago tem a ver com um nome sobejamente conhecido, por todos nós, cuja figura adquiriu enorme popularidade não só pelas canções que interpretava, mas pelas suas performances em palco: refiro-me a Zaida Lhongo. A inenarrável comoção colectiva e a mobilização de massas desencadeadas pela sua morte e demonstradas dramaticamente no seu funeral, terá deixado muito boa gente perplexa, jogando no ar a pergunta: afinal, quem tinha sido aquela mulher?
O terceiro e último exemplo tem a ver com um jovem músico, Azagaia, de seu nome e que, há poucos dias, foi chamado à Procuradoria Geral da República para ser ouvido, tendo que responder, segundo a comunicação social, a três questões: se a letra da música «Povo no Poder» era sua; se com ela visava atingir algum objectivo e se a letra não incitaria à violência.
Voltaremos a estes três exemplos, mais adiante.
Referimo-nos, no capítulo anterior ao facto de a arte africana, no geral, manter uma interacção estruturante, dinâmica e inspiradora com o meio em que ela surge. Assim é com as narrativas da tradição oral que, além da sua vocação lúdica e comunicativa, são um meio de perpetuação de valores sócio-culturais e éticos. Assim tem sido com o teatro, na recriação e na interpelação do quotidiano, tal como a literatura, tal como a música, tal como as artes plásticas, estas levando muito mais longe as suas incursões do ponto de vista mítico e religioso.
Por outro lado, há uma espécie de vocação estética entranhada nas múltiplas ocorrências da vida dos africanos. Um exemplo pode ser encontrado nas canções de trabalho nascidas em condições penosas e adversas como as plantações de algodão nos Sul dos Estados Unidos, nas minas de ouro, na África do Sul, nas roças de café e cacau, em Angola e São Tomé e Príncipe, ou no chibalo, em Moçambique.
Outro exemplo, do já referido povo Makonde, que como é sabido, dissemina o seu apurado e proverbial sentido estético não só entre diferentes objectos artísticos, como esculturas e máscaras, mas em todo o tipo de objectos, instrumentos rituais, cerâmica, arquitectura, etc.
Na verdade, o que essas realidades nos oferecem é a migração contínua e dialéctica entre a vida e a arte, numa celebração da existência nos seus elementos ao mesmo tempo mais comezinhos e complexos. Daí que a lógica do compromisso sócio-cultural, ético e político, a que nos referimos no capítulo anterior, parece aí prevalecer nas interacções estéticas, em geral, e artísticas, em particular. A estética de desinteresse defendida por Kant, e que caracterizou a segunda metade do século XIX e o primeiro quartel do século XX, não tem certamente ressonância no universo africano dada a filosofia de vida que lhe está subjacente em que o sentido estético se encontra, quase sempre, ancorado em motivações existenciais determinadas e concretas.
Contrariamente à desumanização da arte, no Ocidente, que ocorre segundo Adorno, na medida em que a sociedade se tornava menos humana, a arte africana foi e é uma festa dos sentidos e de um apego visceral à vida. Estaremos, certamente, nesta conformidade, perante o que Wole Soyinka (2000: xii) considera “as virtudes da complementaridade do mundo” do mundo africano em relação a outras culturas.
Olhando para o cenário artístico moçambicano, por exemplo, podemos verificar a manifestação desta lógica, sobretudo enquanto compromisso social ou político, intensamente presente na pintura de um Mankeu, ou de um Malangatana, na já referida arte Makonde, nas esculturas de um Chissano, na poesia de Noémia de Sousa, Craveirinha, Rui Nogar, na prosa de Paulina Chiziane, Mia Couto ou Ungulani Ba Ka Khosa, nas representações de um Mutumbela Gogo, ou dos vários grupos de teatro comunitário, nos ritmos populares quer da velha guarda, com Francisco Mahekwane, Xidiminguana, Alexandre Langa, ou das novas gerações, com particular destaque dos jovens rappers.
Retomando o primeiro exemplo citado no início deste capítulo, de Mestre Missau, se por um lado traduz o eterno conflito de gerações, ou a inadaptação em relação à modernidade, por outro lado, ele é revelador de um profundo sentido ético que se encontra indissoluvelmente aliado a uma ideia, ou ideal, de fazer e de estar na arte e na vida. De uma coerência extraordinária, esta é uma lição de que independentemente de todas as contingências e de todas as atribulações que a vida nos coloca, tanto ela como a própria arte são regidas por códigos de valor que explicam a sua universalidade e perenidade, enquanto lugar de grandeza, elevação e dignidade. Se é verdade que o espírito que cria, o artista, não tem que necessariamente coincidir com o autor empírico, o homem de carne e osso, a arte e a cultura só beneficiam quando eles não colidem.
Tendo feito da provocação, através de toda uma gestualidade prenhe de um erotismo exuberante, que perturbou conjuntamente as normas estéticas e éticas, a já desaparecida Zaida Lhongo acabou por unir as mais dispersas sensibilidades, numa manifestação fúnebre sem precedentes, no país, em relação a um artista, demonstrando que a sua irreverência acabou por ter um efeito transformador e mobilizador, quebrando preconceitos e desbravando caminhos que outros tentam, hoje, percorrer, mas sem a mesma sedução e carisma.
A recriação da sua música e das suas letras pelas novas gerações é um sinal revelador da sua permanência e, sobretudo, de que todas as transgressões de que ela foi protagonista, foram meios e não um fim em si. E os que não entenderam esse detalhe jamais perceberão a grande artista que ela foi. E acredito que parte significativa do seu sucesso residirá no apelativo desencontro entre, por exemplo, o apelo moralista das letras que cantou e a teatral e provocatória imoralidade que exibiu.
Finalmente, o exemplo do jovem Azagaia serve, possivelmente, para desfazer alguns dos equívocos que levam muitos, sobretudo os mais velhos, a insurgir-se contra a irresponsabilidade e indiferença dos jovens em matéria de sensibilidade e percepção das realidades do país e do mundo. Concordo que dificilmente se pode recusar a pertinência da constatação depreciativa sobre o valor artístico dos muitos sobreprodutos culturais que têm sido produzidos, divulgados e consumidos entre nós, ou sobre as fragilidades formativas de alguns dos pseudo-artistas que inundam os palcos por esse país fora, ou sobre a ausência de conteúdo do que se ouve e que se pretende ser arte.
Enquanto elevação espiritual do homem, a arte dispensa o exibicionismo rasca, o espalhafato, a cacofonia e a obscenidade gratuita, e todas as formas de imediatismo, populismo, pedantismo e superficialidade.
A arte, a arte de verdade, apela à sensibilidade, à inteligência, à fruição, à profundidade, à iluminação, à edificação interior e a um prazer quase sem limites.
No entanto, tem-se assistido, no meio da agitada e ruidosa turbulência que caracteriza as novas gerações, um duplo fenómeno revelador de um sentido estético singular, por um lado, e de um sentido ético, por outro, que tem vindo a ganhar forma e impacto. O primeiro liga-se à preocupação real e estimulante, por parte de alguns desses jovens, de recriar ritmos tradicionais conciliando-os com outros, tomados de empréstimo na arena internacional.
E este movimento simbiótico envolve, sintomaticamente, o campo linguístico o que leva esses mesmos jovens a cantarem numa língua que não coincide necessariamente com a língua ou as línguas que usam na sua comunicação quotidiana.
O segundo fenómeno tem a ver com a veia inconformada e interpelativa de alguns jovens músicos moçambicanos que, sobretudo através da cadência do rap, fazem passar mensagens de uma profundidade e de uma ousadia inusitadas no nosso meio.
Consciente ou inconscientemente, eles acabam por inscrever-se numa tradição, de longa data, dentro e fora do país, que assume a arte como um mecanismo de afirmação e de compromisso social, através da denúncia e de uma atitude inconformada em relação a situações que gostariam que mudassem o que naturalmente perturba os poderes instituídos.
Se o exemplo de Mestre Missau e, de certo modo, o de Zaida e de muitos outros artistas de qualidade reconhecida, traduzem a indiferença com que esses mesmos poderes lidam com a arte, e com a cultura, em geral, o caso do jovem Azagaia acaba por revelar precisamente o contrário, só que num sentido perverso e anacrónico.
Essa é e foi sempre a vocação da arte. Da simples contemplação ou da simples dimensão lúdica ela se institui também como sintoma e como consciência crítica e ética das sociedades concorrendo para a sua transformação e para a sua evolução. E cabe a essas mesmas sociedades, sobretudo os que regem os destinos delas, decidir se aceitam, ou não, essa transformação.
CONCLUSÃOGostaria de concluir esta minha exposição, regressando ao filósofo alemão Theodor Adorno da conhecida Escola de Frankfurt.
Primeiro, para recuperar uma questão que ele coloca na sua obra Teoria Estética: se a arte ainda é possível, se após a sua completa emancipação ela não eliminou e perdeu os seus pressupostos.
Segundo, para agarrar-me a uma afirmação sua de que, quanto mais se compreendem os as obras de arte, tanto menos se saboreiam.
Se em relação à primeira questão, entendo que, enquanto expressão humana, a arte será sempre um campo inesgotável de todas as possibilidades. Da vida e da morte. Da grandeza e da precariedade. Da convicção e da incerteza. Do conformismo e da irreverência. Do amor e do ódio. Da virtude e do vício. Da ordem e da transgressão. Do encanto e do desencanto.
Agora, até que ponto ao tentar compreender uma obra se reduz o prazer que ela proporciona? Esta é uma questão que deixo em aberto. Deliberadamente. Não nos esqueçamos que a arte é, afinal, o reino de todas as possibilidades. Sobretudo, a possibilidade de existir.
Maputo, 6 de Maio de 2008
Bibliografia
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* Oração de Sapiência proferida no Instituto Superior "Maria Mãe de África", nas V Jornadas de Ética, em 6 de Maio de 2008.
- FRANCISCO NOA
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